MULHER E DIVERSIDADE
Em sua coluna de estreia na Vogue, a escritora Carla Akotirene fala sobre a realidade das mulheres negras brasileiras

A escritora e colunista de Vogue Carla Akotirene (Foto: Antonio Terra)
Este mês é chamado de Julho das Pretas em comemoração á luta das mulheres negras latino- americanas e afro-caribenhas, que desde 1992, na República Dominicana, decidiram marcar no calendário suas resistências antiescravização e antirracismos.
De lá para cá, essas mulheres combatem a política de cancelamento endereçada às populações negras, tendo em vista o fim da escravização não traduzir garantias fundamentais como emprego, educação, desencarceramento e proteção das vidas negras, especialmente, nos países terceiro mundistas.
As mortes violentas de um lado e a exploração trabalhista do outro, nos fazem recordar o caso de Mirtes Souza, trabalhadora doméstica que perdeu seu filho, Miguel, após cair do 9º andar do condomínio onde ela e sua mãe trabalhavam. Porque a criança temporariamente ficou sob os cuidados da patroa enquanto Mirtes passeava com o cachorro. Não bastasse a dor, adiante hackers apagaram do Instagram todas as fotos do menino. Aqui, percebamos, estamos diante das maneiras pelas quais a saúde mental e dignidade das mulheres negras são canceladas.
É de se estranhar a comoção antirracista brasileira em solidariedade à família de George Floyd, nos Estados Unidos, ignorar solenemente a violência global racista contra as mulheres. O Brasil é o 5º do mundo em cancelamento efetivo de mulheres por meio dos feminicídios. Especificamente agora, chamo atenção para a trabalhadora negra, mãe de 5 filhos, pisada na cabeça, em Paralheiros, durante operação policial, extremo sul de São Paulo. A referida atenção política a vulnerabilidade negra somada aos ativismos internacionais perdem a força quando falamos de mulheres negras.
Lélia Gonzalez, Vilma Reis, Claudia Pons, Angela Figueiredo, Zelinda Barros, Mariele Franco, Teresa de Benguela, Beatriz Nascimento, Luiza Bairros, Djamila Ribeiro e Sueli Carneiro, são algumas destacadas cabeças do feminismo negro brasileiro. Segundo elas, temos na conexão do racismo, capitalismo e patriarcado a resposta para o cancelamento humano. A política de morte física, intelectual, simbólica, econômica e espiritual acontece, especialmente, contra as mulheres negras. A desatenção feminista se deve à raça, a desatenção antirracista se deve a gênero.